segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

Breve relato de uma experiência na “Feira do Troca” de Olhos D´água

por Jayme Vasconcellos*


Tinha carro com placa do DF, de MG, de MS, do RJ, de SP, do TO, de GO, é claro. Pelo menos os que eu vi.

Bicho de pelúcia e bicho vivo. Um bezerrinho lindo. Qual será o destino dele?

Livro já escrito e livro sendo escrito. Na hora. Por poetas. Declamando versos em troca de um trocado.

As meninas do bambolê, trocando ‘saberes bambolísticos’.

Tinha roqueiro, motociclista (ou seria motoqueiro?), sertanejo, hippie, mestres dos saberes tradicionais, artesãos, artistas, turistas, moradores.

Cachaça tradicional, curtida em barril de carvalho, ao lado de drinks coloridos, com chapeuzinho dentro de um abacaxi. 

Catira e moda de viola numa esquina e rock autoral, progressivo e seminal em outra, no chamado ‘Sarau Psicodélico’.

Verduras, legumes, frutas, plantas decorativas... senti o cheiro de outras ervas, mas não há provas de nada...

Brinquedos usados, muito usados, mas ainda ‘brincáveis’.

Teve briga. Dois rapazes feridos à faca. Tinha polícia, muita. Teve briga de casal também. Essas coisas acontecem. 

Zé do Pife e as Juvelinas estavam lá. A Cia. Circênicos também.

Tinha cerveja. Mais cara e mais gelada nos bares. Mais barata e mais quente nos vendedores de rua.

Muita tranqueira. Cosa velha mesmo. Mas bastante coisa que dava para reaproveitar. Dar um uso novo ao velho.

Gente nova, gente velha. Magro, gordo. Preto, branco, pardo, mestiço... gringo, não vi nenhum. Índio, também não. Onde será que estavam?

Profissionais dos usados, donos de antiquários e brechós. Saindo carregados de produtos.

Amadores dos usados. Gente como eu, que tentou vender ou trocar algo que não mais servia. 

Levei uns 20 livros. Romances, livros técnicos (de direito, administração...), religiosos. Estava aberto ao escambo. Fiquei 4 horas no meu humilde ponto de venda. Várias pessoas pararam para olhar. Cheguei a ter 3 clientes de uma só vez olhando os livros. Uau, que legal! 

Vendi 5 exemplares, por 10 reais (cada). Talvez tivesse vendido mais. Perguntaram se tinha algo do Sidney Sheldon e do Carl Sagan. Não tinha. Pena.

Foram 50 reais arrecadados. Gastei muito mais. Hospedagem, combustível, alimentação. Mesmo assim, saí no lucro. A experiência foi ótima. Comercial. Administrativa. Antropológica. Sociológica. Filosófica (bati um bom papo sobre ciência x religião). Escatológica (pisei em dejetos caninos... isso dá sorte?). Repito, saí no lucro.


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Feira do Troca: tradição que resiste
(Foto: Jayme Vasconcellos / Criatividade para todos)
Olhos D´água, pequeno povoado de Alexânia (GO), fica a cerca de 100 km de Brasília. Sedia duas vezes por ano a tradicional Feira do Troca. No início, moradores trocavam artigos de casa, utensílios de trabalho, roupas e artesanato. O bom e velho escambo. A troca por necessidade deixou de existir, mas a troca justa permanece. Negociar faz parte do processo, em que todos saem ganhando. Também dá para vender, é claro. Mas o preço é honesto. 

Estive nas duas edições de 2016 da Feira do Troca. O relato acima mescla a experiência dessas duas ocasiões. O texto foi escrito durante a feira. Enquanto esperava ‘clientes’ e novos amigos, rascunhava o que via, o que ouvia, o que sentia. Como disse antes, saí no lucro.
 
*Jornalista e radialista. Editor de conteúdo do Criatividade para todos. 

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